São Paulo – Muitos querem começar seu próprio negócio, mas temem perder todo o dinheiro investido e fechar as portas. É uma preocupação justificada: entre as empresas brasileiras com dois anos de vida, um quarto vai à falência, segundo o Sebrae.
As complicações financeiras são uma causa comum para o fim dos negócios no Brasil - um país que está atrás de países como Madagascar e Zimbábue em termos de educação financeira.
“Como a grande maioria dos empreendedores não possui preparo nessa área, eles vão tocando a empresa pelo operacional – sendo um bom vendedor ou bom cozinheiro, por exemplo – no lugar de buscarem o conhecimento administrativo ou de arranjar um sócio que entenda do tema”, explica João Natal, consultor de finanças do Sebrae/SP. “Ele só começa a pensar no orçamento quando está quebrado, quando deveria fazer o inverso.”
No caso do empreendedorismo, a receita para a falência soma essa falta de educação financeira à falta de planejamento empresarial.
“A montagem do plano de negócios é uma grande oportunidade: é o momento em que você pode aprender aquilo em que não possui experiência prática, verificando fatos e comprovando se seu empreendimento deve ou não ser iniciado”, afirma Alberto Ajzental, docente da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Por isso, se você quiser ser um empreendedor de sucesso, será preciso se dedicar ao planejamento do seu empreendimento – inclusive das suas contas. “Sim, há pessoas que não sabiam nada de matemática e que viraram grandes empresários, mas essas são exceções. A regra é que você tem de pesquisar e planejar para suprir sua falta de conhecimento prévio”, completa Ajzental.
E é claro que de nada adianta planejar muito bem as finanças e não ter disciplina para executar à risca aquilo que foi proposto. “Além de conhecimento, é preciso ter capacidade de execução: não adianta nada dar certo no papel e no dia a dia fazer qualquer coisa”, alerta José Kobori, professor do MBA em Finanças do Ibmec/DF.
Quer abrir um negócio, mas não sabe o que precisa calcular para isso? Confira, a seguir, um passo a passo de contas fundamentais na hora de criar um empreendimento:
1. Investimento inicial
A primeira grande conta que um futuro empreendedor precisa fazer é a do investimento inicial: o valor necessário para começar seu negócio.
O investimento inclui reformas feitas no ponto comercial, equipamentos e estoque, por exemplo. Porém, muitos empreendedores se esquecem de que além de juntar dinheiro para a estrutura física da empresa, é preciso ter recursos para operar enquanto o negócio não der retorno. Por exemplo, o salário dos seus funcionários e a sua própria remuneração.
“Há uma série de itens que é preciso sustentar antes de obter receita. É como se a viagem nem tivesse começado, mas o taxímetro já está ligado”, diz Ajzental, da FGV. “Você abrirá o negócio, formará sua carteira de clientes e finalmente chegará ao ponto de equilíbrio, no qual a empresa consegue bancar suas despesas, e aí pode começar a pensar em remuneração”, completa Natal, do Sebrae/SP.
O consultor também pede atenção ao pensar de onde virá o investimento: faça o possível para fugir dos empréstimos bancários, preferindo sua própria poupança.
“Normalmente, o banco não empresta dinheiro para uma empresa no início: ele precisa analisar o rendimento do negócio para colocar linhas de financiamento à disposição. Por isso, o futuro empreendedor costuma pegar empréstimo na modalidade pessoa física, o que sai muito mais caro do que pessoa jurídica.”
E qual o valor que deve ser guardado para sustentar a operação do negócio até despesas e receitas se equilibrarem?
Isso varia muito de acordo com o tipo de negócio, afirmam os especialistas. Enquanto alguns citaram um mínimo de três meses, outros sugeriram dois anos de poupança.
“O que ele tem de juntar de capital inicial não é apenas ter o investimento fixo inicial, mas prever ao longo de quanto tempo ele ficará no prejuízo. Pode ser que, pelos estudos dele, a receita será menor do que as despesas durante três meses. Por ser que seja por anos”, resume Ajzental.
No fim, tudo depende da sua análise de retorno do investimento (veja mais no item 5 desta matéria).
2. Capital de giro
O valor que fica guardado para sustentar a operação da sua empresa e impedir que ela fique no vermelho é conhecido também pelo termo “capital de giro”.
Além de estimar o valor do capital de giro antes de abrir a empresa, será preciso fazer novos aportes ao longo dos anos para cobrir situações emergenciais, explica Kobori.
“Muitos esquecem da necessidade de capital de giro ao longo do negócio e tiram o dinheiro do caixa, achando que ele está sobrando. Aí, chega a hora de fazer algum pagamento de emergência e não há dinheiro suficiente para isso. As empresas vão ao banco e tomam um empréstimo a taxas altíssimas, que vão além da taxa de retorno do negócio. É por isso que muitas empresas quebram”, explica o docente do Ibmec/DF.
Na abertura da empresa, poderíamos pensar que o capital de giro é o valor que será usado com o salário dos funcionários e com as contas de água e luz até que o negócio atinja seu ponto de equilíbrio.
Já na situação de um negócio que já se paga, o capital de giro seria a reserva necessária para sustentar um pagamento parcelado do seu cliente ou uma semana com menos vendas do que o esperado, por exemplo. O dinheiro para o capital de giro vem das próprias receitas da empresa.
Para não comprometer demais seu capital de giro, Natal recomenda evitar imobilizações desnecessárias. Isso é: tente não se comprometer com grandes aquisições de uma tacada só.
“No lugar de comprar maquinários, alugue-os. Busque móveis em leilões ou em classificados de usados. Terceirize atividades que não são as principais da empresa. Essas são algumas das alternativas para que você gaste menos recursos”, elenca o consultor do Sebrae/SP.
3. Fluxo de caixa: despesas e receitas
O fluxo de caixa é o que fica na conta da sua empresa após as entradas e saídas de dinheiro – ou seja, após efetivamente receber receitas e descontar despesas do seu orçamento empresarial.
É um orientador financeiro do dia a dia do negócio e também do seu futuro: computando recebimentos e pagamentos parcelados, você pode ver se a situação da sua empresa estará mais ou menos complicadas daqui a alguns meses.
As despesas, explica Natal, podem ser divididas entre fixas e variáveis: a diferença entre as duas é sua possibilidade de variar de acordo com as vendas do negócio. Contas como aluguel, água e luz não mudam significativamente por conta de negociações, e por isso não consideradas despesas fixas. Já o custo de matéria-prima e os impostos são despesas variáveis, porque estão diretamente relacionados à quantidade vendida.
Além de olhar para os custos, é preciso olhar para as receitas. A análise de quanta demanda haverá pelo seu produto ou serviço é uma das partes mais difíceis de calcular dentro do orçamento, diz o consultor do Sebrae.
Há diversas variáveis inter-relacionadas em jogo: é preciso saber quanto pode ser vendido diante de um certo preço, por exemplo. Com a estimativa de receita pronta, é fácil calcular quanta matéria-prima será pedida e quanto o negócio pagará de imposto com essa operação.
“A arte está em você conseguir antever quais são todas as despesas - dos impostos até possíveis incertezas – e prever a receita, desenhando seu resultado para cada cenário possível”, explica Natal.
4. Precificação
Uma outra conta importantíssima que o empreendedor precisa fazer, como adiantamos no item anterior, é a do seu preço de venda.
Normalmente, o empreendedor põe o preço de acordo com o que é pratica no mercado. Porém, há um processo mais complexo, que deve levar em consideração diversos fatores.
Caso seu produto seja algo comum, é preciso levar em consideração o incentivo que seu futuro consumidor terá para trocar o certo pelo duvidoso. “Será que meu preço está de acordo com a concorrência, sabendo-se que meu negócio é novo? Por que meu cliente iria na minha loja e não na que ele já conhece?”, pondera Natal.
No final, é preciso ver se o preço colocado irá gerar o retorno esperado, a partir da estimativa de quantidade vendida. “É importante colocar o preço na ponta do lápis. Vou poder concorrer ou não? Vou vender pouco, com margem maior? Ou vender muito, com margem menor?”
5. Resultado
Computando as receitas e despesas do dia a dia do negócio, chegamos ao “fluxo de caixa livre”: o valor que realmente sobra no mês e poderá ser redirecionado para recompor seu capital de giro, explica Kobori, do Ibmec/DF.
“Os novos investimentos para recompor seu capital de giro – sendo que o primeiro foi criado a partir do investimento inicial - vêm desse fluxo de caixa livre, conseguido a partir de boas margens.”
Com a adição dos resultados de cada mês, a tendência é que também haja o retorno do seu investimento inicial – ou seja, lucro. “Fazendo essa projeção de fluxo de caixa, você pode ver se sua empresa é viável ou não financeiramente. Caberá a você ver se o retorno justifica ou não a criação desse empreendimento”, afirma Ajzental, da FGV.
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